DPES consegue vitória histórica no STF e põe fim a superlotação nas unidades socioeducativas

A Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo (DPES) conseguiu uma vitória histórica no Supremo Tribunal Federal, que nesta sexta-feira (21), finalizou o julgamento do o Habeas Corpus (HC) Coletivo 143.988/ES, que limita em 100% a lotação das unidades de socioeducativas em todo Brasil. A 2ª Turma entendeu, nos termos do voto do relator Edson Fachin, que o Brasil não pode mais conviver com superlotação no sistema socioeducativo.

No julgamento, realizado em sessão virtual, o STF não só decretou o fim da superlotação em unidades socioeducativas no Brasil, ao conceder a ordem pleiteada no HC da DPES, como também estabeleceu um novo limite. A capacidade total de socioeducandos por unidade será de 100% e não mais os 119% definidos em liminar concedida anteriormente por Fachin.

O Habeas Corpus foi impetrado no ano de 2017 e, em agosto de 2018, foi deferida liminar fixando o limite de 119% em unidades socioeducativas no Estado do Espírito Santo. Em maio de 2019, a decisão foi estendida aos Estados da Bahia, Ceará, Pernambuco e Rio de Janeiro.

Ineditismo

A decisão é histórica por vários motivos:  com o HC 143.988/ES foi a primeira vez em que o Supremo reconheceu o princípio numerus clausus*; o Tribunal foi além e reduziu de 119% para 100% o limite de lotação das unidades; haverá possibilidade de internação domiciliar e será criado um observatório nacional da socioeducação. Essas são medidas determinadas pelo STF para que não ocorra superlotação nas unidades.

O HC 143.988/ES já produz efeitos em relação à melhoria da qualidade do funcionamento de unidades socioeducativas no país, sobretudo no contexto da pandemia. A medida serve de fundamento para o tratamento adequado a ser conferido ao sistema socioeducativo conforme Recomendação 62 do Conselho Nacional de Justiça.

Corte Interamericana

Este é um passo importante para que o Brasil possa cumprir com determinações da Corte Interamericana de Direitos Humanos em relação ao Caso Unidade de Atendimento Socioeducativo (Unis-Norte), que conta com medidas de urgência do sistema interamericano de direitos humanos desde 2009.

Parceiros

As Defensorias Públicas da Bahia, Ceará, Rio de Janeiro, Pernambuco e Sergipe ingressaram no processo e somaram esforços para reunir dados e avaliar os efeitos da decisão nos respectivos Estados.

O Habeas Corpus contou também com a participação de entidades da sociedade civil, como Ibccrim, Alana, Conectas e MNDH, bem como da Ordem dos Advogados do Brasil/RJ, que ajudou a construir o precedente, que coincide com os 30 anos do Estatuto da Criança e do Adolescente.

Voto

Confira um trecho do voto do ministro relator Edson Fachin:

Propõe-se, ainda, a observância dos seguintes critérios e parâmetros, a serem observados pelos Magistrados nas unidades de internação que operam com a taxa de ocupação dos adolescentes superior à capacidade projetada:

  1. i) adoção do princípio numerus clausus como estratégia de gestão, com a liberação de nova vaga na hipótese de ingresso;
  2. ii) reavaliação dos adolescentes internados exclusivamente em razão da reiteração em infrações cometidas sem violência ou grave ameaça à pessoa, com a designação de audiência e oitiva da equipe técnica para o mister;

iii) proceder-se à transferência dos adolescentes sobressalentes para outras unidades que não estejam com capacidade de ocupação superior ao limite projetado do estabelecimento, contanto que em localidade próxima à residência dos seus familiares;

  1. iv) subsidiariamente, caso as medidas propostas sejam insuficientes e essa transferência não seja possível, o magistrado deverá atender ao parâmetro fixado no art. 49, II, da Lei 12.594/2012, até que seja atingido o limite máximo de ocupação;
  2. iv) na hipótese de impossibilidade de adoção das medidas supra, que haja conversão de medidas de internação em internações domiciliares, sem qualquer prejuízo ao escorreito cumprimento do plano individual de atendimento – podendo ser adotadas diligências adicionais de modo a viabilizar o seu adequado acompanhamento e execução;
  3. v) a internação domiciliar poderá ser cumulada com a imposição de medidas protetivas e/ou acompanhada da advertência ao adolescente infrator de que o descumprimento injustificado do plano individual de atendimento ou a reiteração em atos infracionais poderá acarretar a volta ao estabelecimento de origem;
  4. vi) a fiscalização da internação domiciliar poderá ser deprecada à respectiva Comarca, nos casos em que o local da residência do interno não coincida com o da execução da medida de internação, respeitadas as regras de competência e organização judiciária;

vii) alternativamente, a adoção justificada pelo magistrado de outras diretrizes que entenda adequadas e condizentes com os postulados constitucionais e demais instrumentos normativos.

 

*Limite máximo estabelecido de indivíduos que podem ser admitidos em um organismo ou instituição.