NOTA DE ESCLARECIMENTO sobre Decisão que autoriza suspensão do pagamento dos lucros em programa de indenização dos atingidos na bacia do Rio Doce

  1. As Defensorias Públicas do Estado do Espírito Santo e da União tomaram conhecimento pela imprensa de que, no dia 27 de dezembro de 2018, foi proferida, pela 12ª Vara Federal Cível e Agrária de Belo Horizonte, decisão que suspendeu a validade das Deliberações n. 111 e 119 do Comitê Interfederativo (CIF), construídas após longo trabalho técnico desse colegiado e amplo debate entre governo, sociedade e Fundação Renova.

 

  1. Isto é, a decisão judicial autorizou, a partir de dezembro de 2018, a dedução/compensação dos pagamentos realizados a título de Auxílio Financeiro Emergencial (AFE) das indenizações por lucros cessantes, a serem pagas no Programa de Indenização Mediada.

 

  1. Além disso, determinou que a Fundação Renova não poderá exigir dos atingidos a devolução ou ressarcimento de valores recebidos a título de auxílio financeiro que, eventualmente, superem o valor total dos lucros cessantes a serem recebidos.

 

  1. Cabe registrar que causa espanto às Defensorias Públicas que a referida questão, embora pacificada em 2017, e reafirmada por meio de Recomendação Conjunta das Defensorias e Ministérios Públicos, tenha sido resgatada pelas empresas Samarco, Vale e BHP na iminência do pagamento dos lucros cessantes referentes ao terceiro ano do desastre ambiental.

 

  1. A decisão agrava a insegurança jurídica nos territórios, que convivem com o caos da má execução dos programas socioeconômicos e sucessivas violações aos direitos humanos dos atingidos. No momento em que autoriza a suspensão do pagamento dos lucros cessantes previstos, desconsidera os acordos individuais já firmados, causando impacto potencial a milhares de famílias da bacia do rio Doce.

 

  1. As Defensorias Públicas entendem que a decisão mesclou obrigações constantes do Termo de Transação e Ajuste de Conduta (TTAC) e eximiu, liminarmente, as empresas Samarco Mineração, Vale e BHP Billiton Brasil do compromisso, expressamente assumido, de promover a proteção social dos atingidos pelo desastre socioambiental por elas causado, com atenção aos padrões e normas que regem iguais serviços prestados pelos Poderes Públicos, Cláusula 5ª, nos termos das Cláusulas 54, 137 e 209 do referido Acordo.

 

  1. Reafirma-se que o auxílio financeiro emergencial e a indenização são programas distintos, com contornos contratuais, prazos e objetivos distintos. Se o primeiro visa a impedir que famílias da bacia do rio Doce sejam privadas do seu sustento, o segundo visa ao devido ressarcimento pelos danos morais e patrimoniais sofridos.

 

  1. Nesse contexto, de maneira contrária ao expressamente acordado, foram transferidos ao Erário Público – e à toda a sociedade – os custos de promover a proteção social das famílias desamparadas por conta de um desastre causado por empresas privadas, o que acaba por causar sério risco de lesão ao Estado Brasileiro, em um momento de grave crise financeira e fiscal.

 

  1. Da mesma forma, desconsidera-se o recente compromisso dessas mesmas empresas, ao assinarem o Termo de Ajustamento de Conduta sobre Governança (TAC-Gov), no sentido de que deve haver “transparência no processo de pesquisa e definição dos parâmetros de indenização das pessoas atingidas, assegurada a sua participação nos termos do TTAC e deste ACORDO”, conforme consta na Cláusula Segunda, XII, desse acordo.

 

  1. Por fim, externamos a preocupação de que o sistema CIF seja deliberadamente esvaziado a partir da judicialização de questões que contrariem os interesses das empresas responsáveis pelo desastre.

 

  1. Diante desse quadro, as Defensorias Públicas manifestam a sua solidariedade às atingidas e aos atingidos que, após mais de 3 (três) anos do desastre, enfrentam obstáculos constantes à obtenção do direito à reparação integral e DECLARAM que, assim que tomarem integral conhecimento dos autos, adotarão todas as medidas judiciais necessárias à reversão da ordem proferida.

 

Defensoria Pública do Estado do Espírito Santo

Defensoria Pública da União

Acesse a nota aqui: Nota DPU e DPES sobre Decisão que autoriza suspensão do pagamento dos lucros em programa de indenização dos atingidos na bacia do Rio Doce